23.10.12



O revólver duvida da eficácia do homem.
Sente que as arcadas tremerão apenas quando
se levantar um dedo, uma ideia profícua
que cubra a terra de abóbadas nebulosas.
O revólver, no entanto, chama-te às causas.
Endeusas os amuletos, tens fetiches
por objectos, mas esqueces que os dramas
tomam as formas mais benignas.
Devaneios, diria, numa noite chauvinista
como esta, noite de enfado e recato,
em que cruzas, paranóico, todas  as farmácias,
à procura de um comprimido que funcione.
Todos os pedaços do teu corpo são algas
remanescentes. Verde defunto, leitor
de psicogramas, talvez transportador
de psitacídeos ou de drogas aeroportuárias.
Tudo isso o revólver ignora, porque seu
é o gesto brusco da ponte, a água
subliminar do edifício inconstante que desaba
por objectivos, o amor e a protecção exigidos
a quem já não pode abraçar as balas,
e tece a realidade em permanente delírio.