3.12.08

caderno

Creio na cruel região das palavras, creio na religião
dos peixes, no ocaso do homem, creio nas crianças perdidas,
não creio em mim. Nado nas letras como o tio dos patos,
no primeiro filactério, sorvendo patranhas pelas barbatanas
em ondas de cofre-forte, coração que mentes
quando me ajudas a esquecer porque nasci.

Antes de morrer, quero decepar um braço,
substitui-lo por prata
porque é verdade que o perdão não mata,
mas a verdade, sim. Os meus tendões, vou desligá-los.
A resina da inocência bebe-me, e logo esponjosa rabisca
este fio de líquido em que me transformei
ao longo do exausto cimento. Em todo o meu corpo
há uma canalização excessiva que rasga as sinopses
e percorre os frios campos da ferrovia.

Não leves mais pássaros, gentil catenária,
não brinques com os pássaros como se pudessem voar
pássaros meu,
vai desmontar-me ao fim do dia
na banca dos dedos. Oirar, oirar, espero, o fio terra.
Tento não parecer sensível aos teus dedos,
por timidez não me rendo, obstinação,
arrisco, em situações de engano, cobrir-me de pesadelos.